quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

"Paulo de Tarso - GRÉCIA" - Joy Harington (parte 7)

SÉTIMA PARTE. GRÉCIA — Página: 94
(Tradução: Padre José Vicente Martins, SJ em 2013)

FILIPOS: Paulo e os seus companheiros ficam com Lídia. Paulo e Silas são presos por feitiçaria: mais tarde são libertados como cidadãos Romanos. 
O Governador da prisão é baptizado. Paulo vai para Atenas onde faz um discurso brilhante aos filósofos que se interessam, mas não aceitam a Ressurreição.
 Paulo fica sozinho, amargamente desapontado.


      Paulo, Timóteo e Silas, com o seu novo amigo Lucas, embarcaram de Troades para a Macedónia a norte da Grécia.
Lucas estava em terreno familiar e conduziu o caminho através do terreno plano, colocando-lhes marcas para se orientarem, indicando-lhes os melhores lugares para  repousarem quando se sentissem cansados, até que finalmente chegassem à proximidade de Filipos, a principal cidade nesta zona da Macedónia. Era um lugar impressionante com o seu fórum Romano, templos Gregos, estátuas de deuses Romanos e com as suas ruas colunadas. 
    Timóteo podia ter andado todo o dia a explorar, mas havia trabalho a fazer, e alojamento a encontrar. Paulo estava ansioso por transmitir a sua mensagem ao povo, e no Sábado foram aos bancos do Rio Gangites, onde tinham ouvido dizer que havia um lugar de oração. A maioria dos seus ouvintes era de mulheres e entre elas estava Lídia, comerciante de tecido de cor. Foi baptizada com todo o agregado familiar. Depois insistiu que todos os quatro deviam ficar na sua casa em Filipos.
     A sua sala maior era simultaneamente loja e sala de trabalho, apinhada ao alto com fardos de tecido de cor. Mais tecido de cor estava dependurado fora, onde também um sinal acima da porta indicava a sua profissão. Timóteo depressa procurou fazer a experiência  com o banho da tinta, agitando o líquido quente com um pau, e levantando de vez em quando uma peça de tecido para ver como a cor ia ficando. Lídia ria-se com a sua brincadeira, depois foi falar com Lucas que estava a escrever numa tabuinha.
    “Que estás a escrever?” perguntou ela.
    “A respeito de vós,” disse Lucas, com um sorriso, e mostrou-lhe o que tinha escrito. Parecia ser um diário e tinha anotado tudo acerca do encontro nos bancos do Rio Gangites, como ela tinha sido baptizada, e que os tinha trazido a todos para ficarem em sua casa. Ela corou de prazer ao ver-se mencionada, e perguntou a Lucas se tomava nota de tudo.
   “Sim,” garantiu-lhe Lucas.” Vou fazer o relato de toda a viagem: tudo o que nos acontece. E tudo o que aconteceu quando Jesus estava na Galileia – quero dizer, procurar encontrar tudo o que se refere a isso também.”
   “Estás a sobrecarregar-te com muito trabalho,” disse Lídia rindo, e depois voltou à sua ocupação.
   “Onde estão Paulo e Silas?” perguntou Lucas
   “Foram com Timóteo e comigo à praça do mercado comprar um rolo de tecido, mas deixámo-los ficar lá. Está lá uma jovem rapariga a predizer a sorte, e insiste em chateá-los – gritando atrás deles, compreendes. Eu avisei-os para a evitarem, mas Paulo julga que está possessa de um demónio e parece pensar que a pode ajudar.”
    “Possessa por um demónio, ou doente da cabeça – é a mesma coisa. Talvez eu possa ajudar,” disse Lucas, e deixando a escrita, foi à procura dos seus amigos.
Quando os encontrou, Paulo e Silas estavam a ver as habilidades de uma rapariga escrava que estava a dançar, rodeada por uma pequena multidão. Tinha cerca de doze anos – uma criança esquelética, pálida, de olhos arregalados. O seu mestre, um homem  de aspecto próspero, mantinha-se perto dela, com um chicote na mão. A rapariga contorcia-se com estranhos movimentos a imitar  uma cobra, mas no fim da dança caiu no chão e ficou imóvel. Um homem avançou para a frente da multidão, atirando algumas moedas.
   “Profecia, profecia,” disse ele.            
    A rapariga pôs-se de joelhos, com os olhos muito abertos. Levantou os braços finos e começou a falar com uma voz estranha e anormal.
    “A serva do grande Deus Apolo vai falar…” clamava ela. “Terás uma boa saúde e uma vida longa.”
    Um outro homem deu algum dinheiro ao mestre da rapariga e clamou para ela,”Que é que o grande Apolo me diz a mim?”
    O seu mestre tocou os ombros da rapariga com o chicote e repetiu a pergunta. A rapariga levantou-se, correu ao encontro do  homem e agarrou-lhe no braço.
   “Aqueles que tu amas hão-de prosperar, aqueles que odeias hão-de morrer,” disse ela; e espontaneamente, correu para um terceiro homem e gritou-lhe alto com a sua   estranha voz rouca,”Este homem é chamado pelo grande Apolo para ser seu servo. Terá o poder de curar ou o de provocar  a morte.”
    Alguns da multidão aplaudiram e congratularam o homem, que atirou uma mão cheia de prata para o mestre; mas Paulo e Silas ficaram espantados com o que tinham visto.
   “Quem é ela? Lídia disse-te?” perguntou Silas, e Paulo disse-lhe que era a criança órfã de pais Judeus, vendida para a escravatura quando eles morreram. O mestre dela ganhava uma rica vida com os seus truques.
    Naquele momento o mestre da rapariga viu-os, e pensando que seriam potenciais fregueses, clamou, “Dinheiro, bons estrangeiros, dinheiro para as profecias de Apolo!”
   Paulo não deu sinal de ter ouvido o homem, que continuava a procurar atraí-los.
  “Ela anunciará o vosso futuro, senhores,” disse ele. “A serva de Apolo, que possui poderes divinos.”
   Subitamente a rapariga correu e agarrou-se a Paulo, gritando em alta voz, “Estes homens são servos do Deus Altíssimo. Eles podem mostrar-nos um caminho de salvação.” 
   Com gentileza Paulo afastou as suas mãos, mas ela atirou-se ao chão em frente dele, ainda a gritar que eles eram servos do Altíssimo Deus. Depois, começou a bater no chão histericamente com os punhos, a chorar e a gritar, “Dizei-nos o caminho da salvação. Dizei-nos o caminho da salvação…”
   Paulo olhou para ela com compaixão, depois disse tranquilamente e com grande autoridade.
  “Espírito imundo, em nome de Jesus Cristo, eu te ordeno que a abandones.” 
   A rapariga deu um breve soluço de choro e depois ficou tranquila. Passado um momento levantou a cabeça e olhou à volta, sem saber onde estava. O seu mestre aproximou-se  irritado. Levantou o chicote e gritou-lhe, “Profecia, profecia em nome de Apolo.”
    Ela olhou para ele aterrada e desorientada, depois ocultou-se dele, escondendo a sua cara. Ele voltou-se irado para Paulo. “Que truque judaico é este?” perguntou.
   “Ele usou o nome de um novo deus… Jesus Cristo,” disse alguém da multidão.
   “Homens de Filipos,” disse Paulo seriamente, “oiçam-me. Não há mais que um só Deus, criador de todas as coisas, e há um só Salvador, Jesus Cristo, em cujo nome expulsei o demónio desta criança.”
   “Demónio?” gritou furiosamente o mestre da rapariga. “Demónio? Ela foi nomeada por Apolo para ser sua serva.”
    Lucas tomou propositadamente o seu caminho pelo meio da multidão.
   “Queres dizer,” afirmou ele, “que tu usavas as aflições dela para espalhar as tuas mentiras e amealhar dinheiro para ti próprio.” 
    Inclinou-se sobre a rapariguinha, pegando-lhe na mão,  falando-lhe tranquilamente.
Ouviram-se gritos indignados do mestre e de alguns membros da multidão.
    Lucas tomou nos seus braços a criança, dizendo-lhe baixinho que estava tudo bem e que ninguém ia magoá-la.
   “Põem-na no chão! trovejou o mestre dela. “Eu tratarei de lhe provocar algum bom senso.”
  “Ela vai para casa comigo,” disse Lucas com firmeza.
   “O quê?” protestou o homem. “Não podes fazer isso. Eu obrigo-te com a lei. A rapariga pertence-me. Paguei bom dinheiro por ela.”
   “Ela já ganhou mais dinheiro para ti, do que tu alguma vez deste por ela,” disse Lucas, ao que o homem respondeu que isso era um assunto com que Lucas nada tinha que ver.
   “É assunto que me diz respeito,” afirmou Lucas firmemente. “Eu sou médico e esta criança está doente.”
    O homem voltou-se para a multidão para arranjar apoio. “Se está doente,” disse, “é porque este homem aqui, lançou uma maldição sobre ela. Feitiçaria, é o que é. Eu tenho a lei contra ele. Verás se não tenho. Somos muito exigentes nesta cidade acerca de coisas como esta.”
    Silas disse-lhe de modo terminante que era melhor que ele próprio tivesse mais cuidado com a lei. O homem ficou assim menos seguro da sua razão, e apresentava-se agitado. Sabia que o seu modo de ganhar a vida estava perdido, mas sabia também que era um trabalho ilegal, uma vez que feitiçaria e bruxedo não eram coisas permitidas  nas ruas. Mas agora ao ver Lucas a abrir caminho através da multidão com a criança nos braços, para a levar com ele para a casa de Lídia, voltou-se de novo para a multidão com modos de fanfarrão. 
  “Cavalheiros,” disse, “sereis minhas testemunhas. Todos vistes o que aconteceu. A rapariga estava apta e forte antes de estes dois Judeus aparecerem na cena a lançar uma maldição sobre ela. Já tivemos antes complicações com Judeus nesta cidade, arruinando a nossa forma de ganhar a vida, insultando os nossos deuses e o nosso Imperador. Vamos deixar que isto aconteça novamente?”
    Houve uma resmungadela indignada dos homens que estavam à volta, e começaram a aproximar-se ameaçadoramente de Paulo e Silas. Mas Paulo falou calmamente.
   “Nós não insultamos o Imperador. Também ele é um servo do Deus vivo.”
    O mestre da rapariga viu aqui  a sua oportunidade. “O Imperador um servo,” repetiu.
“Ele condenou-se pela sua própria boca.”
    Paulo manteve-se na sua própria posição, argumentando que o homem estava a correr riscos contra a própria lei, ao empregar a criança como adivinha da sorte. Mas os ouvintes foram facilmente influenciados pelo homem furioso embora atemorizado, e, gritando que Paulo e Silas deviam ser levados à corte, apanharam-nos e arrastaram-nos estrada abaixo.
   Nessa noite, enquanto a menina escrava estava deitada numa cama preparada, a ver Lídia acender as lâmpadas, Timóteo, que tinha estado na corte, contou a Lucas a história amarga. Não tinha havido julgamento apropriado, nem hipótese de se defenderem. Os magistrados tinham aceitado a palavra do mestre da rapariga, que Paulo e Silas tinham estado a praticar feitiçaria, tinham insultado o Imperador e tinham procurado convencer o povo a pagar tributo a um “deus estrangeiro.”
   “Eu devia tê-los avisado,” disse Lídia, censurando-se a si própria na sua tristeza. “Não é seguro para um Judeu tornar-se notado nesta cidade. Eles pegam em qualquer desculpa para os destruir. Se ao menos tivessem vindo comigo para casa.” 
    “Eu não consegui chegar-me perto deles quando os lictores os arrastaram para fora da corte,” disse Timóteo.”Tinha-se juntado uma enorme multidão. Foi horrível. Pareciam mais  bestas do que homens.” Tremia violentamente com a lembrança, e Lucas obrigou-o a  parar e sentou-se a seu lado.
    “Como é que se comportaram?” perguntou ele. “Viste-los quando…?”
    “Sim, vi-os,” disse Timóteo. “Estavam atados a um pilar… e despidos até è cintura. Então os lictores – eram quatro – açoitaram-nos. Eu pensei que nunca mais acabassem… e a cada pancada a multidão dava um grito de alegria – como se estivessem a assistir a uma espécie de entretenimento.”
     Ele tremia de angústia e de raiva. Lucas colocou-lhe a mão no braço, e perguntou como é que Paulo e Silas se aguentaram.
    “Não deram um só grito,” disse Timóteo. “Apesar das suas costas estarem dilaceradas e a sangrar – estavam em carne viva, Lucas, completamente em carne viva – não ouvi um único grito. Voltei a vê-los quando estavam a ser levados para a cadeia.”
    “Conseguiam andar?” Perguntou Lucas, e quando Timóteo respondeu que tinham que  conseguir, sendo conduzidos como gado, disse-lhe quanto desejou poder ir ter com eles. “Eu sou médico,” acrescentou Lucas. “Talvez me deixem entrar para  tratar-lhes das suas feridas.”                                                                            
   Timóteo acenou com a cabeça. “Não,” disse, “Eu tentei. O próprio governador da prisão ficou encarregado deles. Ninguém terá autorização de chegar junto deles esta noite.”
  Houve silêncio por um momento, e então Lídia foi à janela e abriu-a.
 “Como está quente,” disse ela. “Quente e sereno. Parece uma ameaça de tempestade.”
  Pela primeira vez a rapariga na cama falou, e agora com uma voz normal de criança, não o grito de cavalo da praça do mercado.
  “Parece o que aconteceu antes do terramoto,” disse ela.
  “Terramoto?” perguntou Lídia, admirada.
  “A minha mãe e pai morreram num terramoto, sabem,” disse a rapariga. “Eu era muito pequena, mas lembro-me que antes estava também assim, como agora…”
   Entretanto na cadeia da cidade Paulo e Silas eram cuidadosamente guardados. Os dois guardas de serviço no pátio fora das celas deles, lamentavam-se um ao outro acerca do calor e da falta de ar da noite, mas depois apressaram-se a atender e fazer a saudação ao governador quando ele saiu de sua casa ali perto. Era um oficial Romano, um Centurião. Tendo-se assegurado que tudo estava em ordem, tirou o elmo e enrugou a testa. E nesse momento ouviu um som de canto. Admirado, atravessou para as celas e espreitou pela grade. Através dela ouviam-se as palavras do salmo que Paulo e Silas cantavam:

                         Ó dai graças ao Senhor porque Ele é bom;
                         Porque a Sua misericórdia é para sempre.
                         A pedra que os construtores rejeitaram
                         Tornou-se e pedra angular.
                         Isto é obra do Senhor; é uma maravilha aos nossos olhos.
                         Bendito o que vem em nome do Senhor.
                         Ó dai graças ao Senhor porque Ele é bom;
                         E a Sua misericórdia é para sempre…. 

    O governador afastou-se da grade, e olhou interrogativamente para os guardas, mas eles somente encolheram os ombros e riram. Por um instante o governador hesitou, e olhou como se fosse abrir a cela e entrar, mas em vez disso voltou-se e foi para casa.
    Nessa noite quando foi deitar-se, o governador não podia tirar da lembrança os dois Judeus prisioneiros. Quando desapertou o colete de peito, falou deles à sua esposa, e disse-lhe que os ouviu a cantar. Uma frase lhe ficou na mente: “Bendito o que vem em nome do Senhor.” Inclinou-se na janela, e escutou atentamente, mas em todo o lado havia agora apenas silêncio.
    Na pequena e apinhada cela ali perto, Paulo e Silas, com os pés nos cepos, suportavam o calor sufocante. Os lívidos vergões nas suas costas denunciavam a flagelação que tinham sofrido, e tornavam-lhes doloroso encostarem-se à parede atrás deles. Olhavam com pena para os seus companheiros, alguns deles sentados com a cabeça entre os joelhos a tentar dormir. Um homem com a cara ferida e embrutecida que estava deitado com a cabeça nos cepos pediu outro canto. “Ajuda a passar o tempo,” disse ele.  Apesar de exausto pelo seu castigo, Silas começou a cantar e Paulo juntou-se a ele enquanto um após outro os prisioneiros levantavam a cabeça para ouvir.
                                    
                     Deus é o nosso refúgio e a nossa força
                     Uma verdadeira ajuda na tribulação.
                     Por isso não teremos medo,
                     Nem que a terra se transforme,
                     E mesmo que as montanhas se agitem no coração dos mares;
                     E mesmo que as águas rujam a serem agitadas,
                     Ainda que as montanhas oscilem e tremam.

    O som das vozes acordou o governador deitado ao lado da sua esposa a dormir; e agora no silêncio da noite ele pôde ouvir as palavras consoladoras:

                      Estai tranquilos e sabei que Eu sou Deus:
                      Serei exaltado entre as nações,
                      Serei exaltado na terra.
                      O Senhor dos exércitos está connosco.
                      O Deus de Jacob é o nosso refúgio.
                                            
     Houve silêncio por um momento, e depois, um distante trovão  de mau agoiro, seguido por um estrondo de parede a cair. A casa estremeceu, alguns jarros caíram de uma estante, e o fecho da janela que tinha ficado aberta para arejar, caiu esmagado, ficando o quarto às escuras. O governador levantou-se, e a sua esposa acordou e gritou de terror. 
   “Luzes, tragam luzes!” clamou o governador, dirigindo-se à porta às apalpadelas. O  estrondo continuou como um trovão, e houve gritaria confusa dos guardas e prisioneiros.
    Um momento depois  entrou no quarto um guarda a cambalear, com a luz tremeluzente da tocha a iluminar-lhe a cara em pânico.
   “Está tudo  bem, senhor?” conseguiu perguntar.
    O governador puxou da espada, e depois tirou a tocha ao guarda, dando-lhe uma ordem severa de voltar a cumprir o seu dever. No silêncio de morte que se seguiu ao estrondo do terramoto, o governador e o guarda correram de casa para a cela dos prisioneiros. A porta estava completamente aberta. Dentro, totalmente escuro. Não se ouvia qualquer ruído.
   “Quem é que abriu a porta?” perguntou o governador.
   “Foi o choque do terramoto, senhor,” disse o guarda.
    O governador estava espantado. Ele sabia que perder os seus prisioneiros significava desgraça, e que seria melhor morrer às próprias mãos. Levantou a espada, com a ponta   virada para o coração. “Não, não!” A sua mulher saiu a correr de casa e atirou-se-lhe aos pés, agarrando-o e segurando o braço  que segurava a espada.
   “Silêncio meu amor,”disse o governador tranquilamente. “Tu conheces a lei. É melhor morrer às minhas próprias mãos do que ser vítima de honra.”
    A sua esposa soçobrou a chorar, quando ele levantou  novamente a espada, mas da escuridão da cela ouviu-se um grito.
   “Não se mate a si próprio. Estamos todos aqui.” Era a voz de Paulo.
   “Tragam uma luz”, gritou o governador, e quando a trouxeram, ele pôde ver pelo tremeluzir da lâmpada, Paulo e Silas de pé na cela, com as algemas caídas. Atrás deles, os outros prisioneiros estavam em grupo, calados de medo.
    O guarda, recuperando rapidamente a coragem, contou-os à pressa.
   “Está tudo certo, senhor, não falta ninguém,” disse. 
   O governador cambaleou, e encostou-se à parede como suporte, ordenando ao guarda que trouxesse os dois Judeus ao pátio. Ele obedeceu, fechando depois a cela como pôde, porque o terramoto a tinha arrancado da armação. O que estava a acontecer no pátio causou-lhe admiração, porque o que ele viu foi o governador, um Centurião Romano, cair de joelhos em frente de Paulo e de Silas.
   “Levanta-te”, disse Paulo.”Não há razão nenhuma para  ter medo.” 
   “Senhores,” perguntou o governador, “É verdade, aquilo que dizem, que vós sois os servos do Deus Altíssimo?”
   “Sim,” disse Paulo.
   “Que devo fazer para ser … salvo?” perguntou o governador.
    A sua esposa que o tinha ajudado a levantar-se e agora estava a seu lado, procurou confortá-lo. “Mas tu estás salvo,” disse ela. “Salvo da morte.” Mas o governador ainda a tremer, abanou a cabeça.
    Paulo olhou directamente para ele, compreendendo a sua necessidade.
   “Acredita no Senhor Jesus,”disse ele, “E tu e a tua família sereis salvos.”
   “O que é que ele quer dizer?” perguntou a mulher em voz baixa de admiração.
    O seu marido disse-lhe para ir lá dentro a preparar alimentação e vestuário para os seus hóspedes, e água para lhes lavar as feridas; e ainda admirada, obedeceu e entrou em casa.
    O governador voltou-se para Paulo e Silas, e com muita cortesia deu-lhes as boas vindas a sua casa, pedindo-lhes que lhe falassem do seu Senhor.

    No sol brilhante da manhã seguinte, as pessoas da cidade andavam fora a ver a destruição causada pelo terramoto. A casa de Lídia tinha sido pouco danificada, apesar de o sinal fora da porta ter caído, estando ainda no meio das telhas do tecto. A jovem rapariga estava ocupada a varrer o lixo e as pedras da sala grande para a rua, enquanto dentro de casa Lídia e Timóteo endireitavam um banco de trabalho que tinha caído, e limpavam um tanque de corante.  No pátio um galo cantou, e a menina, parando de varrer para o admirar, subitamente viu na estrada alguém que lhe era familiar.
   “Aí vem ele;” clamou entusiasmada. “Aí vem o doutor.” 
    Lídia e Timóteo pararam o trabalho e apressaram-se a ir à porta para saudarem Lucas, que mal podia esperar para lhes contar as suas notícias.
   “Bem, como é que eles estavam? Conseguiste entrar?” perguntaram-lhe apressadamente.  
   “Consegui entrar”, disse ele, “e falei com o guarda; Foi bastante amigável. Aconteceu a coisa mais admirável.”
  “Que foi?” perguntou Timóteo, e Lídia queria saber se tinham ficado livres.
 “Livres para saírem quando quiserem.”
  Timóteo olhou para ele com admiração.”Bem, porque é que não vieram contigo?”
  “Espera enquanto te respondo,” disse Lucas com um sorriso. “Em primeiro lugar, o governador da prisão, a sua família e todo o pessoal  familiar receberam o baptismo.”
   O quê? Timóteo ficou incrédulo, enquanto Lídia murmurava, “Deus seja louvado.”
   Lucas explicou que Paulo e Silas estavam com o governador e família na sua casa. Tinham-lhes dado comida e roupas lavadas, e parece que enquanto estavam no pequeno-almoço tinham vindo lictores dos magistrados com ordens para o governador os libertar.
  “Mas porquê?” perguntou Timóteo.
  “O guarda pensa que os magistrados ficaram assustados por causa do terramoto ter acontecido logo a seguir à prisão deles. Pensou que estava em causa um poder sobrenatural. De qualquer maneira, estão ansiosos por retirá-los da cidade.”
  “Mas onde estão eles agora?” perguntou Timóteo.          
  “Eles recusaram sair até que os próprios magistrados venham fazer um pedido formal de desculpas. O guarda disse que foi tão agradável como assistir a uma peça, ver Paulo e Silas ali de pé diante do governador da prisão, vestidos de togas Romanas, a declarar que como cidadãos Romanos tinham sido tratados de forma vergonhosa e ilegal. Os lictores estavam verdadeiramente assustados, parece, e apressaram-se a fazer um relato aos magistrados.”
   “E os magistrados irão, que pensas?” perguntou Timóteo.
   “Eu penso que é possível,” disse Lucas. “É ilegal flagelar ou prender cidadãos sem julgamento. Temos que esperar para ver.”

     E enquanto na casa de Lídia acabavam de limpar os destroços do terramoto, e depois se ocupavam da preparação das boas vindas a Paulo e Silas, uma cena extraordinária estava a ter lugar no pátio da cadeia. 
    No cimo das escadas por onde se descia da casa do governador, estavam Paulo e Silas, com uma apresentação muito diferente da que os dois prisioneiros tinham tido na noite anterior. Estavam vestidos de togas pertencentes ao governador. As suas costas laceradas tinham sido habilidosamente tratadas. Tinham sido lavadas as marcas da sujeira da prisão, e tinham sido bem alimentados. Estavam com dignidade ao lado do governador e da sua mulher com dois guardas de serviço. Ao fundo das escadas, humilhados e apologéticos, estavam dois magistrados.
   “Nós somos cidadãos Romanos, e contudo flagelaram-nos publicamente,” disse Paulo com severidade.
   “Senhores, nós não sabíamos,” disse um dos magistrados. “Pedimos desculpa com toda a humildade.”
    Paulo declarou que ele e Silas tinham sido aprisionados sem qualquer espécie de julgamento, e que nem lhes fora dada nenhuma hipótese de falarem em sua própria defesa.
    “Senhor, tudo o que diz é verdade”, disse o outro magistrado.”Nós admitimos que como homens bons e cidadãos de Roma foram verdadeiramente sujeitos a uma grande injustiça. Com toda a humildade pedimos desculpa e esperamos o vosso perdão.”
    Com grande dignidade Paulo aceitou as suas desculpas, e com alívio os magistrados esperaram enquanto Paulo se voltava para o governador e lhe apertava calorosamente a mão. Depois ele e Silas despediram-se da mulher do governador, e dos dois guardas. Quando desciam as escadas para se retirarem, um dos magistrados adiantou-se a  perguntar polidamente onde é que iam ficar.
   “Vamos ter com os nossos amigos”, disse Paulo.
   “Para vossa segurança”, disse o magistrado, “ eu aconselhar-vos-ia a deixar a cidade imediatamente. A lei fará tudo o que está ao seu alcance para vos proteger, mas há elementos subversivos, entendem, e seria prudente não os subestimar,”
    Paulo não comentou. Os magistrados, fizeram uma vénia quando passaram por eles, e depois mostraram-se indispostos ao ver o governador e a sua esposa e os dois guardas a sorrir e a dizer adeus a Paulo e Silas, que voltaram atrás a despedirem-se junto das grades da prisão.

    Houve grande júbilo na casa de Lídia quando eles voltaram para lá, mas Paulo e Silas concordaram com Lucas que seria mais prudente irem-se embora quase imediatamente. Levaram Timóteo com eles; mas Lucas ficou na casa de Lídia que se tornou o lugar de encontro dos irmãos cristãos em Filipos. Era estranho que o nome Cristãos, inventado pelos descrentes de Antioquia, se tivesse tornado o nome pelo qual eram mais conhecidos –- e  havia agora um número bastante grande deles. 
    Durante dois meses não ouviram nada de Paulo, até que um dia Lídia se apressava a entrar em casa com grande exaltação a clamar.
   “Uma carta… Uma carta por fim,” acenando com um rolo de papel.
   “Deles?” perguntou Lucas, e Lídia respondeu que devia ser. Foram comerciantes de Beroea que a trouxeram e disseram que lhes tinha sido entregue pelo “filho de um fabricante de tendas”  que tinha o  nome de Timóteo.
   “De Beroea?” repetiu Lucas, ao tomar o rolo e desenrolá-lo.”Apressaram-se bem.”
    A rapariga, que estava agora saudável e feliz a cuidado de Lídia, correu para ouvir quando ele começou a ler.

Paulo, Silas e Timóteo, servos de Cristo Jesus à nossa irmã Lídia, ao nosso querido              médico Lucas e à família de Cristo em Filipos,
                                                                                                  SAUDAÇÕES.
Esta carta é-vos enviada de Beroea onde chegámos de Tessalónica na semana passada. A nossa estadia ali acabou abruptamente e foi com grande relutância que abandonámos, mas tornou-se necessário fazê-lo para proteger a vida dos nossos amigos Cristãos. Como tantas vezes aconteceu no passado, os Judeus armaram perturbação contra nós e denunciaram às autoridades civis, usando a mesma acusação feita contra o próprio nosso Senhor. Cito as suas palavras: “Estes homens viraram o mundo de cabeça para baixo. São traidores de César dizendo que há outro rei chamado Jesus…” Seguiram-nos inimigos aqui até Beroea, e depois de uma noite de oração chegámos à conclusão da saída dos três, pelos menos por algum tempo. Uma vez que é Paulo que os Judeus estão mais decididos em destruir, ele vai deixar hoje a cidade. Silas e eu, Timóteo, vamos ficar para orientar a jovem igreja, e Paulo vai para sul…para  Atenas.
Rezai por nós, irmãos e irmãs, e principalmente pelo nosso amado Paulo que sempre tem sido como um pai para nós e agora vai para tão longe sem os seus filhos. Ele manda-vos esta mensagem: “Lembrai-vos de quanto vos amo. A graça de nosso Senhor Jesus Cristo esteja convosco.”

      Assim Paulo deixou os seus amigos que se tinham tornado tão íntimos para ele, e embarcou para Atenas. Estava agora sozinho, com uma missão a ser cumprida por ele próprio. 
    Chegado a Atenas passou algum tempo a passear à volta da cidade reparando em tudo o que via – as estátuas, templos e a bela Acrópole entre oliveiras e ciprestes, procurando familiarizar-se com este novo ambiente, e com um novo tipo de ouvintes. Sabia que estava no centro cultural do mundo, a artística e intelectual capital, o primor da mitologia Grega, a Pátria dos maiores artistas, poetas, escritores e oradores que o mundo tinha conhecido. Deu-se conta do desafio desta cidade. Como ia ele falar do reino dos Céus a estes Atenienses que tinham feito na terra o seu próprio céu? Como podia ele pregar de um Deus flagelado e crucificado num lugar onde os maiores filósofos tinham ensinado que um homem devia adorar qualquer outro homem que tivesse a beleza que estava reflectida nas estátuas de Fídias?
     Olhando para uma depois de outra das belas estátuas dos deuses pagãos, reconheceu de novo que devia ser “tudo para todos.” Profundo a pensar, a sua atenção foi atraída por um monumento de pedra perfeitamente plana com a inscrição: “Ao Deus Desconhecido.”  Repetiu as palavras suavemente para si próprio. Tinha encontrado a sua linha de referência.
    Apressou o passo e encontrou-se em Ágora, a colunada praça do mercado no centro de Atenas. Havia ali quiosques com flores brilhantemente coloridas, outros com amostras de livros e perfumes. Os gritos dos comerciantes de escravos proclamavam os seus produtos manufacturados a competir com os vendedores de figos de Caria, ostras de Chios, mel do Monte Himeto. No meio desta gritaria de vozes, ali na praça do mercado, os poetas recitavam as suas doutrinas, os seguidores de Platão expunham as suas teorias acerca da transmigração das almas, e os estóicos a sua nobre filosofia da busca da virtude. Também lá estavam os Epicureus, a ensinar ousadamente que o mundo foi feito por acaso.
    Paulo misturava-se com as multidões, vendo e ouvindo, administrando o seu tempo. Juntou-se ao aglomerado de pessoas à volta de um filósofo Epicureu que afirmava  determinadamente: “Homens de Atenas, porque andais sempre a tentar aplacar os deuses, vivendo com medo deles, esperando os seus favores? Não podeis entender que os deuses cujas estátuas adornam a nossa cidade são seres celestiais, a viver noutro mundo, um mundo muito afastado deste mundo de homens mortais? Eles vivem a sua vida, nós vivemos a nossa, e devemos vivê-la em plenitude.
     Os Epicureus asseguravam aos seus ouvintes que os deuses não se importavam com as suas orações, os seus sacrifícios e dos seus pecados leves; que deviam portanto procurar felicidade e alegria neste mundo, uma vez que era o único que tinham, antes de morrer e desaparecer em nada.   
    Paulo retirou-se e foi para o próximo grupo, que estava a ouvir um pregador “Estóico.”
    “Oiçam a voz interior da consciência,” argumentava o Estóico.”É essa a divina faísca em cada um de nós, a unir-nos com a Razão Divina que criou o mundo. Nada importa senão isto: que devemos viver em harmonia, seguindo sempre o melhor em tudo, não fazendo caso da dor, da pobreza ou da injustiça que nos possa ofender. Estas coisas não são reais; não fazem parte da Razão Divina de que somos uma parte. Vós mesmos podeis tornar-vos deuses, porque a natureza divina vive em vós…” 
    Quando Paulo ouviu esta filosofia que tanto se assemelhava à dos cristãos, as suas esperanças aumentaram. No seu entusiasmo, subitamente exclamou, “Tens razão. A Natureza Divina de Cristo Ressuscitado!” 
     Todas as cabeças se viraram para ver Paulo. O pregador fez uma  pausa. Isto era a espécie de acontecimento que o povo apreciava: ideias novas, discussão, estrangeiros a trazerem tópicos frescos para o debate. Um homem junto de Paulo questionou-o: “Que é que disseste, estrangeiro? Ressuscitado o quê?”
     “Cristo,” explicou Paulo. “Jesus, o Filho de Deus…Oh mestres, estais tão perto da verdade. Os vossos corações e mentes estão abertos e preparados para receber a boa nova…”
    O pregador estóico foi esquecido por momentos, enquanto a multidão questionava Paulo, perguntando qual era a boa notícia, e quem era esse Jesus Ressuscitado. O orador Epicureu que tinha terminado o seu discurso, juntou-se ao Estóico, e perguntou bem-humorado quem era o homem baixo de preto, que tinha roubado a audiência do seu rival.
     O Estóico sorriu e disse que não se importava de perder a sua audiência, porque o homem parecia ter alguma coisa de interesse a dizer. “Parece um Judeu, mas fala como um Estóico”, disse. Uma mistura interessante, devemos admitir.” Um homem que estava perto pediu-lhes para se calarem, porque desejava ouvir o que Paulo estava a dizer.
   “Que está ele a dizer?” perguntou o Estóico
   “Muito semelhante  ao que dizias”, foi a resposta, “só que ele professa um novo deus ou deuses. Eu ouvi as palavras “Jesus” e “Ressurreição.”
   “Oh meu caro. Mais deuses, e deuses vindos do Oriente para já!” disse a rir o Epicureu!”
“Será melhor ter cuidado. Este é o lugar onde o nobre Sócrates foi obrigado a beber a cicuta por ensinar os cidadãos a respeito de deuses estrangeiros!”
   Mas o Estóico estava interessado no que Paulo estava a dizer, e abrindo caminho com o Epicureu por meio da multidão, chegou ao pé dele e pediu-lhe para lhes explicar aquilo que soava estranho aos seus ouvidos, se era assunto de religião e filosofia.
   Era a oportunidade que Paulo tinha estado a pedir.
  “Queres dizer que desejas que me dirija ao povo publicamente?” perguntou.
  “Se quiseres, das escadas,” disse o Estóico, e conduziu Paulo à Basílica Stoa, onde todos os novos pregadores se faziam ouvir. Paulo ficou de pé debaixo do arco pintado, e olhou para a multidão, que era agora mais numerosa e esperava em silêncio e expectativa. O estóico perguntou-lhe o nome, e voltou para o meio do povo.
  “Cavalheiros,” disse, “apresento-vos Paulo de Tarso, um visitante de Atenas que tem alguma coisa para nos comunicar.”
   Convidou Paulo a avançar, o que ele fez. Interiormente estava nervoso e motivado; exteriormente parecia calmo e confiado.
  “Cavalheiros de Atenas”, disse ele, “durante a minha curta estadia na vossa bela cidade notei sobretudo uma coisa: que vós sois muito religiosos, e na verdade muito tementes a Deus. Mas entre todos os templos, altares e estátuas, havia uma em particular que me pareceu exprimir o desejo que está a apoiar a vossa religião e as vossas filosofias. Era um altar de pedra lisa, e nela estavam escritas as palavras “Ao Deus Desconhecido”. Amigos, é este “Deus Desconhecido” que eu vos proclamo hoje, para que Ele possa ser conhecido por vós.” 
    Continuou a dizer que havia um só Deus que era o Senhor de todos, quer fosse chamado Divina Razão ou Pai-nosso. Fez a raça humana à Sua imagem, e pôs nos corações de todos os homens em toda a parte o desejo de O encontrar e de O adorar.
   “É este desejo,” continuou, “ implantado em nós pelo Próprio Deus que leva os homens a construir templos, altares e estátuas, mas não seria uma aberração supor que Ele que fez o mundo, precisasse de habitar em templos feitos por mãos humanas?”
   Tinha chegado o tempo, disse, de pôr de parte e afastar tais brinquedos insensatos, e andar ao alto e ao largo para fazermos parte do grande e glorioso plano de Deus do qual ia falar-vos.
   “Através de todos os tempos,” disse ele,“temos tido lampejos da Verdade, mas, agora Deus deu-nos a própria verdade num homem que se tornou a Verdade viva. É Ele Aquele através do qual nós conhecemos o que até agora tendes chamado “O Deus Desconhecido.” E para que todos os homens possam saber e acreditar que Ele e só Ele é o Escolhido, Deus ressuscitou-o dos mortos e ainda hoje está vivo…!”  
    Até este momento a multidão tinha estado a ouvir com atenção. Tudo o que Paulo tinha dito, estava de acordo com muitas das ideias e crenças que tinham ouvido dos seus próprios filósofos e mestres religiosos. Quando Paulo se referiu ao “plano de Deus”, estavam preparados para alguma revelação, mas a ideia de um homem ressuscitado dos mortos reduziu tudo ao ridículo. O fervoroso discurso de Paulo foi interrompido por um grito de riso. Era a última coisa que ele esperava, e para ele foi como um autêntico murro no estômago. Ficou calado, as palavras gelavam nos seus lábios.
    As pessoas estavam agora tão preparadas para ridicularizar como antes tinham estado para ouvir. Entraram em comentários de ridículo: “Temos que adorar um homem morto.” “Estava a fazer de nós parvos.” “Pensa que somos crianças para sermos enganados com uma tal história?” “Onde está o homem que ele diz que foi enviado por Deus?” “Morto?” “Não, vivo.” “Um cadáver  ambulante.” 
      A rir, começaram a dispersar. Paulo estava de pé nas escadas e gelado com o choque, viu-os a retirarem-se. O Estóico foi o último a afastar-se. Colocou no ombro de Paulo a mão amável ou antes condescendente, dizendo, “Não te importes. Pessoalmente achei o teu discurso interessantíssimo. Gostaria de ouvir mais… noutro dia.” 
    Ele retirou-se pelo seu caminho, e Paulo sentou-se nas escadas, com a cabeça entre as mãos. Tinha falhado.



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