SEXTA PARTE. OS GENTIOS — Página: 83
(Tradução: Padre José Vicente Martins, SJ em 2013)
Paulo e Barnabé apedrejados
em Listra. Voltam a Jerusalém. Os irmãos decidem aceitar os Gentios na Igreja.
Paulo, Silas e Timóteo vão para Troades. Paulo, doente, é tratado por Lucas, um
médico Grego que lhe pede para vir para a Macedónia.
LYSTRA, apesar de ser uma localidade de guarnição Romana, era uma daquelas cidades que parecia ter sido muito pouco influenciada pela cultura Grega ou Romana. Os cidadãos eram uma raça robusta, primitiva, de altitude, e somente uma pequena minoria da população era Judia. Por serem tão poucos, os Judeus de Lystra aderiam à sua fé e costumes ainda mais ciosamente que nas comunidades maiores, mas apesar disso havia casos de alguns casamentos mistos. Uma dessas famílias era a de Eunice, uma viúva que vivia com a sua mãe, Lois, e o seu filho Timóteo. Este jovem tinha sido educado na fé Judaica pela sua mãe e avó, mas porque o seu pai tinha sido um Gentio, era visto com alguma suspeição pelos vizinhos, no pequeno quarteirão Judeu da localidade.
Era o dia da Festa de Júpiter e as ruas e a praça do mercado estavam apinhadas com as multidões em dia feriado. No meio delas, a pesquisar com o olhar as caras dos visitantes das aldeias circunvizinhas, andava Timóteo, aos empurrões. Finalmente chegou mesmo ao termo limite da cidade, onde estava o Templo de Júpiter. Subiu a correr as escadas do Templo, para conseguir ter uma vista melhor.
“A paz esteja contigo, Timóteo. Vens ver as multidões?” Quem falava era um mendigo aleijado que estava deitado às portas do Templo. Timóteo tinha-o conhecido toda a sua vida e existia uma amizade calorosa entre o idoso e o rapaz que pareciam aproximar-se por uma sentimento comum de privação. Timóteo saudou-o afectuosamente:
“Ando à procura de dois estrangeiros. Judeus que vieram de Icónio.”
“Os pregadores?”
“Sim. Ouviste-los falar?” Perguntou Timóteo com ansiedade.
“Eles têm estado a pregar na praça do mercado. Eu não podia chegar tão longe, por isso vim até aqui. Penso que eles virão por cá, para encontrarem as multidões.”
Conduziu Timóteo para baixo ao seu lado, e as suas palavras seguintes foram em voz baixa:
“Vês aqueles homens?” Timóteo seguiu o seu olhar e viu um estrangeiro de pé junto de um padeiro Judeu, um dos seus vizinhos. “Andam também à procura deles,” disse baixinho o homem idoso. “Com medo que corrompam os Judeus. É melhor teres cuidado, filho.”
Timóteo voltou-se para trás para o seu amigo e pegou-lhe no braço.
“Mas não ouviste? A mensagem deles é também para os Gentios.”
O entusiasmo da sua voz não deixou de ser notado pelo mendigo, porque ele sabia como a vida tinha sido difícil para o seu jovem amigo. Ter nascido numa família mista tornava-o um homem proscrito. Teria sido melhor para ele, pensava algumas vezes, se tivesse nascido sem pernas. Pegou na mão do rapaz a transmitir-lhe confiança.
“Mas como é que se fazem entender, Timóteo? Não há muitos neste lugar que saibam Grego, e que dia foram escolher, a festa de Júpiter!”
“Aí vêm eles.” Era o estrangeiro a falar. Timóteo deu um salto e viu dois homens a caminhar na direcção deles, acompanhados por um pequeno ajuntamento. Desceu as escadas a correr para ir ao seu encontro.
“A paz esteja convosco senhores…”
Imediatamente o padeiro lhe pegou no braço:
“Aviso-te, Timóteo, nada de ligações com esses homens.”
Timóteo sacudiu-se a libertar-se; mas o outro homem colocou-se entre ele e os dois pregadores, dirigindo-se-lhes com uma voz de assumida autoridade:
“Em nome da comunidade Judaica de Lystra, ordeno-vos aos dois que deixeis esta cidade imediatamente.”
Timóteo ficou furioso, mas um dos pregadores, o mais baixo dos dois, replicou tranquilamente:
“Nós obedecemos à ordem que nos foi dada pelo Senhor.”
O padeiro levantou a voz, “Nós não queremos aqui nenhuma das vossas blasfémias.”
“Não há blasfémia,” disse Paulo. Vós próprios lestes nas escrituras, “eu designei-vos para serdes a luz dos gentios para que possais levar a salvação até aos confins da Terra’.”
Os dois judeus estavam calados, e Timóteo perguntou, “O que é que isso significa, senhor?”
Paulo voltou-se para ele e notou preocupação na cara do rapaz.
“Sabes da promessa feita aos nossos antepassados que Ele havia de mandar um Salvador?” perguntou. Timóteo acenou afirmativamente. “A promessa foi cumprida. Deus enviou o Seu próprio Filho para ser a Luz do Mundo e aqueles que O seguem não andarão mais nas trevas. “Correrão sem desgaste, andarão sem desfalecer, voarão com asas como águias.”
Timóteo sentiu de novo a mão controladora no braço e a voz no seu ouvido, “Timóteo, aviso-te” mas ele nem se importou. As palavras do pregador tinham acendido uma chama de esperança que não poderia ser apagada, e neste momento não existia para ele mais ninguém a não ser o homem que as tinha dito.
“Todos nós, senhor?” perguntou. “ também os Gentios?”
“Todos os homens até aos confins da Terra.”
A chama tornou-se um braseiro, um fogo que parecia consumi-lo e o rapaz ouviu a sua própria voz a gritar: “Diz-lhes. Diz agora a esses Gentios.”
Paulo sentiu um despertar de amor e gratidão para com o jovem e toda a sua preocupação pareceu desaparecer quando, seguido por Barnabé, subiu as escadas do Templo e se voltou para encarar a multidão pagã. Levantou os braços e gritou-lhes:
“Nós trazemos uma mensagem…” Os homens próximos das escadas procuraram aproximar-se e o mendigo, agora deliciado por se encontrar na fila da frente, olhou para Paulo com a mesma esperança e exaltação que Timóteo tinha mostrado.
“Trazemos uma mensagem para vós que andáveis muito longe. Deus deitou abaixo a barreira que antes estava entre nós e que nos mantinha afastados…”
Espalhou-se pela multidão a notícia de que algo de interessante estaria a acontecer, e cada vez mais gente se aproximava das escadas do Templo. Paulo levantou a voz para todos poderem ouvir.
“… Deus enviou vida e luz para vós que vivíeis nas trevas. O seu reinado está aberto para vós e para todos os homens, porque é dentro do Seu amor que respiramos, nos movemos e vivemos.”
Uma multidão bastante grande se tinha juntado já, uma multidão que, talvez sem entender completamente as palavras que eram proferidas, percebia que alguma coisa boa lhes estava a ser oferecida. Mas estava um homem ao lado de Timóteo que entendeu tudo o que Paulo tinha dito, e clamou bem alto, “Eu acredito em ti, senhor.”
Paulo voltou-se e olhou para baixo para o homem magro, com o corpo retorcido e com o rosto a brilhar com fé.
“Levanta-te e anda!”
Não houve um só momento em que olhar de admiração e alegria abandonasse mais o rosto daquele homem. Tomou a mão que lhe era estendida e sentiu o poder e o amor de que Paulo tinha falado a derramar-se no seu corpo quando, pela primeira vez na vida, tropeçou com os seus pés.
Timóteo correu para o segurar quando Paulo largou a mão dele. Mas o mendigo estava de pé e firme.
“Eu posso estar de pé.” Foi um grito de triunfo.
Uma onda de exaltação percorreu a multidão, e os que estavam atrás empurravam para a frente para ver o milagre que tinha acontecido fora do Templo de Júpiter. Ficaram com surpresa de cortar a respiração quando o homem, cujas pernas que tinham sido inúteis, deu três passos para a frente do pregador e se ajoelhou a seus pés.
Subitamente o silêncio de admiração foi interrompido por um grito: “Os deuses desceram até nós em forma de homens – Júpiter e Mercúrio estão connosco.” O grito foi assumido e então como se fosse um só homem a multidão do povo caiu de joelhos em frente do Templo, e dois rapazes subiram as escadas com grinaldas de flores que dependuraram no pescoço de Paulo e Barnabé, prostrando-se depois diante deles.
Por um momento ficaram ali adornados com flores diante da multidão prostrada, depois o seu assombro transformou-se em horror quando a procissão do sacerdote de Júpiter se encaminhou para eles através da multidão. Dois rapazes conduziam a procissão agitando os turíbulos de incenso, e atrás deles vinha o sacerdote pagão; com uma das mãos conduzia uma vaca branca engalanada com flores, e na outra levava uma faca enorme. Eles imaginaram o que estava a acontecer.Mas foi Timóteo que expressou em palavras os seus temores. “Eles pensam que sois Júpiter e Mercúrio. Trazem a vaca para vos fazerem um sacrifício.” Paulo arrancou a grinalda do pescoço e avançou para a frente. Imediatamente um grande grito se ouviu: “Mercúrio! Mercúrio!”
Paulo levantou os braços e a sua voz elevou-se mais alto que os gritos.
“Homens de Lystra, o que é que estais a fazer? Parem, parem!” A procissão fez uma paragem com alguma confusão porque a multidão estava agora a andar, e a empurrar para a frente para ouvir a voz de “Mercúrio”, o mensageiro dos deuses. Paulo falou devagar e deliberadamente.
“Oiçam-me. Nós somos humanos, com a mesma natureza que vós. Foi o Deus vivo que curou este homem. Toda a importância do que temos estado a dizer-vos é que deveis deixar os vossos falsos deuses para acreditar no único Deus vivo que fez o céu e a terra e tudo o que neles existe.”
Estavam agora calados e a ouvir atentamente.
“Em tempos passados, Ele permitiu que todas as nações seguissem os seus próprios caminhos, mas mesmo então não vos deixou sozinhos. É Ele, o único verdadeiro Deus, que vos dá o sol e a chuva para vos trazer alimentação da terra. É Ele que dá vida e esperança. Ele que enche o vosso coração de alegria…”
“Está a falar de Júpiter.” O grito partiu de um sacerdote. “Mercúrio o mensageiro fala de Júpiter. Vede como o grande deus Júpiter está em silêncio.”
Todos os olhos se viraram para a alta figura de Barnabé e com gritos de êxtase, o povo de Lystra caiu novamente de joelhos.
“Parem!” A voz de Barnabé habitualmente tranquila, foi um trovão.
“Júpiter está a falar!” gritou o sacerdote em êxtase de alegria.
Barnabé avançou e olhou para baixo com compaixão para a extraordinária cena que ele e Paulo involuntariamente tinham provocado. Com grande determinação também ele arrancou a grinalda do pescoço e falou-lhes.
“Homens loucos e ignorantes. Não podeis entender? Não há Júpiter nem Mercúrio. Não há outro deus senão o Deus vivo que nenhum homem viu, mas cujas obras estão todas à vossa volta. Nós somos Suas testemunhas…”
“Testemunhas falsas!” Desta vez a interrupção partiu do comerciante que tinha estado à espera da sua oportunidade para manipular os sentimentos da multidão altamente emotiva e levá-la a servir o seu intento. Subiu as escadas e voltou-se para os encarar.
“Homens de Lystra, estes homens que chamais “deuses” são Judeus renegados que têm estado a ser afastados de localidade em localidade por causa da sua pregação maldosa. Estão possessos de espíritos malignos, e foi por magia que vos enfeitiçaram a vós. Olhai para eles de novo. Parecem deuses?”
Foi mais fácil do que ele tinha esperado. Um ruído de riso se fez ouvir da parte de trás, e alguns dos adoradores levantaram-se a olhar agora com hostilidade para os dois homens desmazelados que eles tinham tomado por deuses. Por se sentirem enganados, queriam vingança. O Judeu foi rápido a perceber a nova disposição das pessoas.
“Estes homens são vossos inimigos,” proclamou ele. “Nada, a não ser corrupção pode vir para o vosso povo se derdes ouvidos a estes servos do Maligno. Eles vêm para destruir, para perverter, para praticar magia e feitiçaria no meio de vós. Salvai-vos a vós mesmos, homens de Lystra, salvai-vos antes que seja demasiado tarde, e expulsai estes homens da vossa cidade.”
As suas palavras tiveram exactamente o efeito que ele tinha previsto, e com doentia ansiedade Timóteo ouviu as palavras que o tinham aterrado desde a sua meninice, o slogan certo para incendiar homens enraivecidos: “São Judeus.”
Um sussurro desagradável correu através das pessoas da multidão quando assumiram o grito, reforçado com a outra acusação familiar que dava ao seu ódio o sabor de justa indignação: “Eles insultam os deuses!”
Timóteo falou urgentemente com Paulo.
“Seria melhor vires comigo para casa, porque quando estas multidões em festa se revoltam, tudo pode acontecer.”
“Eu vou convosco até lá,” disse o mendigo, muito orgulhoso da sua força renovada. “Se tentarem tocar-vos, terão que se haver comigo.”
Quando os quatro desciam as escadas, o padeiro agarrou Timóteo pelo braço, e avisou-o. “Se te metes com estes homens serás excomungado. E a tua mãe e a tua avó também!”
Timóteo desprendeu-se com violência do aperto do homem, e ao fazê-lo atingiu-o na cara por acidente. O padeiro recuou a cambalear.
“Vamos, senhores, depressa,” gritou Timóteo, e abriram o caminho pelo meio da multidão, seguidos pelo grito irado do Judeu, a clamar: “Detenham-nos. São perigosos. São violentos.”
O seu grito perdeu-se na confusão do ruído, porque agora o sacerdote e a sua procissão, caminhavam na direcção das grades, e mais alto que os gritos da multidão, levantou-se a voz de um da comitiva: “Libertem o caminho para o sacerdote de Júpiter.” Dois homens armados de cacetes abriram o caminho por entre a multidão, começando a bater nos que impediam o andamento da procissão.
Com um cacete levantado um dos homens voltou-se para Paulo, mas um empurrão do mendigo deu outro rumo à pancada. O outro homem correu para Paulo e bateu-lhe na cabeça. Foi socorrido imediatamente por Barnabé, e enquanto Paulo estava estendido no chão sem se mexer, os seus três amigos foram envolvidos numa luta feroz, com a multidão a gritar à volta deles. Tinha começado uma luta a sério e Barnabé, Timóteo e o mendigo foram afastados para longe de Paulo pela multidão zangada e aos empurrões.
Atordoado pela pancada do cacete, Paulo estava apenas vagamente consciente da procissão do sacerdote que passou perto dele e quando por fim levantou a cabeça, um homem embriagado pegou numa pedra e atirou-a contra ele. Paulo ficou estendido imóvel de cara virada para baixo.
A procissão continuou, e com ela a multidão, com os pés a levantar a poeira e a deixar uma nuvem atrás. A rua estava vazia, com excepção do corpo inerte de Paulo. Mas não por muito tempo. Os dois Judeus que se tinham afastado subindo as escadas para fora da rota da multidão, caminhavam vagarosamente na direcção dele. Com o pé, o comerciante virou Paulo de costas. Ficou deitado, hirto e imóvel, com a cabeça ensanguentada, com a cara ferida e conspurcada da poeira.
Os dois homens olharam um para o outro – um olhar de satisfação. Depois desceram a rua silenciosa.
Subitamente através do terreiro vazio ouviu-se um ruído de corrida. A arfar e cabelos ao vento, Barnabé, Timóteo e o mendigo corriam ao encontro de Paulo ainda inerte. Ajoelharam-se à volta do seu corpo e Barnabé, com a cara a sangrar da luta, pôs a mão sobre o coração de Paulo.
“Está morto?” perguntou Timóteo; Barnabé não respondeu mas chamou pelo nome do amigo – “Paulo, Paulo.”
As pálpebras de Paulo estremeceram, e por fim abriu os olhos e olhou para Barnabé.
A sua voz chegou em surdina. “Que foi o que Estêvão disse? “Senhor, não os culpes deste pecado.”
Quando se aproximaram da casa de Timóteo, a sua mãe ficou horrorizada ao princípio, quando viu o seu filho com tal companhia, porque todos eles estavam esfarrapados e sujos. Mas pôs um colchão no chão para Paulo, e depois de o levantarem para o deitarem sobre ele, trouxeram água para Barnabé poder lavar-lhe as feridas.
Mais tarde nesse dia, quando tinha já caído a noite e Barnabé tinha saído, a velha avó de Timóteo, Lois, perguntou a lamuriar-se, por quanto tempo estes estrangeiros iam ficar.
“Ssh, mãe,” disse Eunice, olhando para o canto onde Timóteo estava acocorado ao lado de Paulo. “Dizem que só até amanhã, ainda que aquele não pareça suficientemente apto para viajar trinta milhas até Derbe.”
Lois protestou porque a sua filha estava a pô-los todos em perigo, acolhendo-os em casa. “Não são somente os Judeus, mas toda a população está contra eles.”
“Isso não é nada, comparado com a alegria de os termos aqui em casa.” disse Eunice com suavidade.
“Alegria?” resmungou a velha senhora. “Um monte de trabalho extra, diria eu.”
“Ssh,” disse Eunice de novo. “Timóteo é aquele em quem estou a pensar. Ele é um rapaz diferente mesmo depois de um só dia na companhia de Paulo. É como ter de novo um pai.” E, ao ver Paulo a agitar-se, levantou-se para lhe preparar uma refeição.
Com o cuidado dela e de Timóteo, Paulo estava de facto suficientemente melhor para sair no dia seguinte. Timóteo sentia-se amargurado por ter que separar-se dele.
“Timóteo, meu filho,” disse Paulo, “pensa naquilo que temos falado, combate o bom combate, guarda firme a fé e uma consciência limpa. Reza sempre por todos os homens para que possam chegar ao conhecimento da verdade.”
“Mas tu voltarás a visitar-nos, não é assim?” perguntou Timóteo, e sendo-lhe dada a certeza, continuou, “Quem me dera poder ir contigo. Pensas que a irmandade me aceitaria apesar de ser meio Grego e não circuncidado?”
“Meu filho,” disse Paulo, “a mensagem de Cristo é para todos aqueles que acreditam.”
Era o dia da Festa de Júpiter e as ruas e a praça do mercado estavam apinhadas com as multidões em dia feriado. No meio delas, a pesquisar com o olhar as caras dos visitantes das aldeias circunvizinhas, andava Timóteo, aos empurrões. Finalmente chegou mesmo ao termo limite da cidade, onde estava o Templo de Júpiter. Subiu a correr as escadas do Templo, para conseguir ter uma vista melhor.
“A paz esteja contigo, Timóteo. Vens ver as multidões?” Quem falava era um mendigo aleijado que estava deitado às portas do Templo. Timóteo tinha-o conhecido toda a sua vida e existia uma amizade calorosa entre o idoso e o rapaz que pareciam aproximar-se por uma sentimento comum de privação. Timóteo saudou-o afectuosamente:
“Ando à procura de dois estrangeiros. Judeus que vieram de Icónio.”
“Os pregadores?”
“Sim. Ouviste-los falar?” Perguntou Timóteo com ansiedade.
“Eles têm estado a pregar na praça do mercado. Eu não podia chegar tão longe, por isso vim até aqui. Penso que eles virão por cá, para encontrarem as multidões.”
Conduziu Timóteo para baixo ao seu lado, e as suas palavras seguintes foram em voz baixa:
“Vês aqueles homens?” Timóteo seguiu o seu olhar e viu um estrangeiro de pé junto de um padeiro Judeu, um dos seus vizinhos. “Andam também à procura deles,” disse baixinho o homem idoso. “Com medo que corrompam os Judeus. É melhor teres cuidado, filho.”
Timóteo voltou-se para trás para o seu amigo e pegou-lhe no braço.
“Mas não ouviste? A mensagem deles é também para os Gentios.”
O entusiasmo da sua voz não deixou de ser notado pelo mendigo, porque ele sabia como a vida tinha sido difícil para o seu jovem amigo. Ter nascido numa família mista tornava-o um homem proscrito. Teria sido melhor para ele, pensava algumas vezes, se tivesse nascido sem pernas. Pegou na mão do rapaz a transmitir-lhe confiança.
“Mas como é que se fazem entender, Timóteo? Não há muitos neste lugar que saibam Grego, e que dia foram escolher, a festa de Júpiter!”
“Aí vêm eles.” Era o estrangeiro a falar. Timóteo deu um salto e viu dois homens a caminhar na direcção deles, acompanhados por um pequeno ajuntamento. Desceu as escadas a correr para ir ao seu encontro.
“A paz esteja convosco senhores…”
Imediatamente o padeiro lhe pegou no braço:
“Aviso-te, Timóteo, nada de ligações com esses homens.”
Timóteo sacudiu-se a libertar-se; mas o outro homem colocou-se entre ele e os dois pregadores, dirigindo-se-lhes com uma voz de assumida autoridade:
“Em nome da comunidade Judaica de Lystra, ordeno-vos aos dois que deixeis esta cidade imediatamente.”
Timóteo ficou furioso, mas um dos pregadores, o mais baixo dos dois, replicou tranquilamente:
“Nós obedecemos à ordem que nos foi dada pelo Senhor.”
O padeiro levantou a voz, “Nós não queremos aqui nenhuma das vossas blasfémias.”
“Não há blasfémia,” disse Paulo. Vós próprios lestes nas escrituras, “eu designei-vos para serdes a luz dos gentios para que possais levar a salvação até aos confins da Terra’.”
Os dois judeus estavam calados, e Timóteo perguntou, “O que é que isso significa, senhor?”
Paulo voltou-se para ele e notou preocupação na cara do rapaz.
“Sabes da promessa feita aos nossos antepassados que Ele havia de mandar um Salvador?” perguntou. Timóteo acenou afirmativamente. “A promessa foi cumprida. Deus enviou o Seu próprio Filho para ser a Luz do Mundo e aqueles que O seguem não andarão mais nas trevas. “Correrão sem desgaste, andarão sem desfalecer, voarão com asas como águias.”
Timóteo sentiu de novo a mão controladora no braço e a voz no seu ouvido, “Timóteo, aviso-te” mas ele nem se importou. As palavras do pregador tinham acendido uma chama de esperança que não poderia ser apagada, e neste momento não existia para ele mais ninguém a não ser o homem que as tinha dito.
“Todos nós, senhor?” perguntou. “ também os Gentios?”
“Todos os homens até aos confins da Terra.”
A chama tornou-se um braseiro, um fogo que parecia consumi-lo e o rapaz ouviu a sua própria voz a gritar: “Diz-lhes. Diz agora a esses Gentios.”
Paulo sentiu um despertar de amor e gratidão para com o jovem e toda a sua preocupação pareceu desaparecer quando, seguido por Barnabé, subiu as escadas do Templo e se voltou para encarar a multidão pagã. Levantou os braços e gritou-lhes:
“Nós trazemos uma mensagem…” Os homens próximos das escadas procuraram aproximar-se e o mendigo, agora deliciado por se encontrar na fila da frente, olhou para Paulo com a mesma esperança e exaltação que Timóteo tinha mostrado.
“Trazemos uma mensagem para vós que andáveis muito longe. Deus deitou abaixo a barreira que antes estava entre nós e que nos mantinha afastados…”
Espalhou-se pela multidão a notícia de que algo de interessante estaria a acontecer, e cada vez mais gente se aproximava das escadas do Templo. Paulo levantou a voz para todos poderem ouvir.
“… Deus enviou vida e luz para vós que vivíeis nas trevas. O seu reinado está aberto para vós e para todos os homens, porque é dentro do Seu amor que respiramos, nos movemos e vivemos.”
Uma multidão bastante grande se tinha juntado já, uma multidão que, talvez sem entender completamente as palavras que eram proferidas, percebia que alguma coisa boa lhes estava a ser oferecida. Mas estava um homem ao lado de Timóteo que entendeu tudo o que Paulo tinha dito, e clamou bem alto, “Eu acredito em ti, senhor.”
Paulo voltou-se e olhou para baixo para o homem magro, com o corpo retorcido e com o rosto a brilhar com fé.
“Levanta-te e anda!”
Não houve um só momento em que olhar de admiração e alegria abandonasse mais o rosto daquele homem. Tomou a mão que lhe era estendida e sentiu o poder e o amor de que Paulo tinha falado a derramar-se no seu corpo quando, pela primeira vez na vida, tropeçou com os seus pés.
Timóteo correu para o segurar quando Paulo largou a mão dele. Mas o mendigo estava de pé e firme.
“Eu posso estar de pé.” Foi um grito de triunfo.
Uma onda de exaltação percorreu a multidão, e os que estavam atrás empurravam para a frente para ver o milagre que tinha acontecido fora do Templo de Júpiter. Ficaram com surpresa de cortar a respiração quando o homem, cujas pernas que tinham sido inúteis, deu três passos para a frente do pregador e se ajoelhou a seus pés.
Subitamente o silêncio de admiração foi interrompido por um grito: “Os deuses desceram até nós em forma de homens – Júpiter e Mercúrio estão connosco.” O grito foi assumido e então como se fosse um só homem a multidão do povo caiu de joelhos em frente do Templo, e dois rapazes subiram as escadas com grinaldas de flores que dependuraram no pescoço de Paulo e Barnabé, prostrando-se depois diante deles.
Por um momento ficaram ali adornados com flores diante da multidão prostrada, depois o seu assombro transformou-se em horror quando a procissão do sacerdote de Júpiter se encaminhou para eles através da multidão. Dois rapazes conduziam a procissão agitando os turíbulos de incenso, e atrás deles vinha o sacerdote pagão; com uma das mãos conduzia uma vaca branca engalanada com flores, e na outra levava uma faca enorme. Eles imaginaram o que estava a acontecer.Mas foi Timóteo que expressou em palavras os seus temores. “Eles pensam que sois Júpiter e Mercúrio. Trazem a vaca para vos fazerem um sacrifício.” Paulo arrancou a grinalda do pescoço e avançou para a frente. Imediatamente um grande grito se ouviu: “Mercúrio! Mercúrio!”
Paulo levantou os braços e a sua voz elevou-se mais alto que os gritos.
“Homens de Lystra, o que é que estais a fazer? Parem, parem!” A procissão fez uma paragem com alguma confusão porque a multidão estava agora a andar, e a empurrar para a frente para ouvir a voz de “Mercúrio”, o mensageiro dos deuses. Paulo falou devagar e deliberadamente.
“Oiçam-me. Nós somos humanos, com a mesma natureza que vós. Foi o Deus vivo que curou este homem. Toda a importância do que temos estado a dizer-vos é que deveis deixar os vossos falsos deuses para acreditar no único Deus vivo que fez o céu e a terra e tudo o que neles existe.”
Estavam agora calados e a ouvir atentamente.
“Em tempos passados, Ele permitiu que todas as nações seguissem os seus próprios caminhos, mas mesmo então não vos deixou sozinhos. É Ele, o único verdadeiro Deus, que vos dá o sol e a chuva para vos trazer alimentação da terra. É Ele que dá vida e esperança. Ele que enche o vosso coração de alegria…”
“Está a falar de Júpiter.” O grito partiu de um sacerdote. “Mercúrio o mensageiro fala de Júpiter. Vede como o grande deus Júpiter está em silêncio.”
Todos os olhos se viraram para a alta figura de Barnabé e com gritos de êxtase, o povo de Lystra caiu novamente de joelhos.
“Parem!” A voz de Barnabé habitualmente tranquila, foi um trovão.
“Júpiter está a falar!” gritou o sacerdote em êxtase de alegria.
Barnabé avançou e olhou para baixo com compaixão para a extraordinária cena que ele e Paulo involuntariamente tinham provocado. Com grande determinação também ele arrancou a grinalda do pescoço e falou-lhes.
“Homens loucos e ignorantes. Não podeis entender? Não há Júpiter nem Mercúrio. Não há outro deus senão o Deus vivo que nenhum homem viu, mas cujas obras estão todas à vossa volta. Nós somos Suas testemunhas…”
“Testemunhas falsas!” Desta vez a interrupção partiu do comerciante que tinha estado à espera da sua oportunidade para manipular os sentimentos da multidão altamente emotiva e levá-la a servir o seu intento. Subiu as escadas e voltou-se para os encarar.
“Homens de Lystra, estes homens que chamais “deuses” são Judeus renegados que têm estado a ser afastados de localidade em localidade por causa da sua pregação maldosa. Estão possessos de espíritos malignos, e foi por magia que vos enfeitiçaram a vós. Olhai para eles de novo. Parecem deuses?”
Foi mais fácil do que ele tinha esperado. Um ruído de riso se fez ouvir da parte de trás, e alguns dos adoradores levantaram-se a olhar agora com hostilidade para os dois homens desmazelados que eles tinham tomado por deuses. Por se sentirem enganados, queriam vingança. O Judeu foi rápido a perceber a nova disposição das pessoas.
“Estes homens são vossos inimigos,” proclamou ele. “Nada, a não ser corrupção pode vir para o vosso povo se derdes ouvidos a estes servos do Maligno. Eles vêm para destruir, para perverter, para praticar magia e feitiçaria no meio de vós. Salvai-vos a vós mesmos, homens de Lystra, salvai-vos antes que seja demasiado tarde, e expulsai estes homens da vossa cidade.”
As suas palavras tiveram exactamente o efeito que ele tinha previsto, e com doentia ansiedade Timóteo ouviu as palavras que o tinham aterrado desde a sua meninice, o slogan certo para incendiar homens enraivecidos: “São Judeus.”
Um sussurro desagradável correu através das pessoas da multidão quando assumiram o grito, reforçado com a outra acusação familiar que dava ao seu ódio o sabor de justa indignação: “Eles insultam os deuses!”
Timóteo falou urgentemente com Paulo.
“Seria melhor vires comigo para casa, porque quando estas multidões em festa se revoltam, tudo pode acontecer.”
“Eu vou convosco até lá,” disse o mendigo, muito orgulhoso da sua força renovada. “Se tentarem tocar-vos, terão que se haver comigo.”
Quando os quatro desciam as escadas, o padeiro agarrou Timóteo pelo braço, e avisou-o. “Se te metes com estes homens serás excomungado. E a tua mãe e a tua avó também!”
Timóteo desprendeu-se com violência do aperto do homem, e ao fazê-lo atingiu-o na cara por acidente. O padeiro recuou a cambalear.
“Vamos, senhores, depressa,” gritou Timóteo, e abriram o caminho pelo meio da multidão, seguidos pelo grito irado do Judeu, a clamar: “Detenham-nos. São perigosos. São violentos.”
O seu grito perdeu-se na confusão do ruído, porque agora o sacerdote e a sua procissão, caminhavam na direcção das grades, e mais alto que os gritos da multidão, levantou-se a voz de um da comitiva: “Libertem o caminho para o sacerdote de Júpiter.” Dois homens armados de cacetes abriram o caminho por entre a multidão, começando a bater nos que impediam o andamento da procissão.
Com um cacete levantado um dos homens voltou-se para Paulo, mas um empurrão do mendigo deu outro rumo à pancada. O outro homem correu para Paulo e bateu-lhe na cabeça. Foi socorrido imediatamente por Barnabé, e enquanto Paulo estava estendido no chão sem se mexer, os seus três amigos foram envolvidos numa luta feroz, com a multidão a gritar à volta deles. Tinha começado uma luta a sério e Barnabé, Timóteo e o mendigo foram afastados para longe de Paulo pela multidão zangada e aos empurrões.
Atordoado pela pancada do cacete, Paulo estava apenas vagamente consciente da procissão do sacerdote que passou perto dele e quando por fim levantou a cabeça, um homem embriagado pegou numa pedra e atirou-a contra ele. Paulo ficou estendido imóvel de cara virada para baixo.
A procissão continuou, e com ela a multidão, com os pés a levantar a poeira e a deixar uma nuvem atrás. A rua estava vazia, com excepção do corpo inerte de Paulo. Mas não por muito tempo. Os dois Judeus que se tinham afastado subindo as escadas para fora da rota da multidão, caminhavam vagarosamente na direcção dele. Com o pé, o comerciante virou Paulo de costas. Ficou deitado, hirto e imóvel, com a cabeça ensanguentada, com a cara ferida e conspurcada da poeira.
Os dois homens olharam um para o outro – um olhar de satisfação. Depois desceram a rua silenciosa.
Subitamente através do terreiro vazio ouviu-se um ruído de corrida. A arfar e cabelos ao vento, Barnabé, Timóteo e o mendigo corriam ao encontro de Paulo ainda inerte. Ajoelharam-se à volta do seu corpo e Barnabé, com a cara a sangrar da luta, pôs a mão sobre o coração de Paulo.
“Está morto?” perguntou Timóteo; Barnabé não respondeu mas chamou pelo nome do amigo – “Paulo, Paulo.”
As pálpebras de Paulo estremeceram, e por fim abriu os olhos e olhou para Barnabé.
A sua voz chegou em surdina. “Que foi o que Estêvão disse? “Senhor, não os culpes deste pecado.”
Quando se aproximaram da casa de Timóteo, a sua mãe ficou horrorizada ao princípio, quando viu o seu filho com tal companhia, porque todos eles estavam esfarrapados e sujos. Mas pôs um colchão no chão para Paulo, e depois de o levantarem para o deitarem sobre ele, trouxeram água para Barnabé poder lavar-lhe as feridas.
Mais tarde nesse dia, quando tinha já caído a noite e Barnabé tinha saído, a velha avó de Timóteo, Lois, perguntou a lamuriar-se, por quanto tempo estes estrangeiros iam ficar.
“Ssh, mãe,” disse Eunice, olhando para o canto onde Timóteo estava acocorado ao lado de Paulo. “Dizem que só até amanhã, ainda que aquele não pareça suficientemente apto para viajar trinta milhas até Derbe.”
Lois protestou porque a sua filha estava a pô-los todos em perigo, acolhendo-os em casa. “Não são somente os Judeus, mas toda a população está contra eles.”
“Isso não é nada, comparado com a alegria de os termos aqui em casa.” disse Eunice com suavidade.
“Alegria?” resmungou a velha senhora. “Um monte de trabalho extra, diria eu.”
“Ssh,” disse Eunice de novo. “Timóteo é aquele em quem estou a pensar. Ele é um rapaz diferente mesmo depois de um só dia na companhia de Paulo. É como ter de novo um pai.” E, ao ver Paulo a agitar-se, levantou-se para lhe preparar uma refeição.
Com o cuidado dela e de Timóteo, Paulo estava de facto suficientemente melhor para sair no dia seguinte. Timóteo sentia-se amargurado por ter que separar-se dele.
“Timóteo, meu filho,” disse Paulo, “pensa naquilo que temos falado, combate o bom combate, guarda firme a fé e uma consciência limpa. Reza sempre por todos os homens para que possam chegar ao conhecimento da verdade.”
“Mas tu voltarás a visitar-nos, não é assim?” perguntou Timóteo, e sendo-lhe dada a certeza, continuou, “Quem me dera poder ir contigo. Pensas que a irmandade me aceitaria apesar de ser meio Grego e não circuncidado?”
“Meu filho,” disse Paulo, “a mensagem de Cristo é para todos aqueles que acreditam.”
Pouco tempo depois, na sala de cima em Jerusalém, estava reunido um conselho formal. Estavam lá Pedro e João, e também Tiago o Justo que, com algum calor, estava a dirigir-lhes a palavra.
“Se alguém não segue toda a Lei de Moisés,” insistia, “não pode salvar-se. Se um Gentio se converte para acreditar em Jesus o Messias, então deve ser circuncidado, como também é qualquer Judeu. Não podemos ter divisões na irmandade – circuncidados e não circuncidados – aqueles que conhecem a Lei e os que a ignoram.”
Encorajado pelo murmúrio de aceitação que concordava com estas palavras, ele disse que em Antioquia, onde os da irmandade se chamavam Cristãos, souberam que havia mais Gentios que Judeus.
“Aceitam Jesus como o Cristo, mas não sabem nada da nossa Lei'', continuou com indignação. “Ainda comem e bebem como pagãos. E mesmo pior, os Judeus Cristãos estão a tornar-se relaxados, a comer e beber com os irmãos Gentios – esquecendo as Leis dos nossos antepassados.”
Imediatamente João se levantou.
“Irmãos,” disse, “lembrem as palavras de Nosso Senhor quando rezava por nós, “Não peço só por eles, mas por todos aqueles que pelas suas palavras acreditam em Mim – para que sejam um, Pai, como nós somos um.”
Tiago deu com a mão uma pancada forte na mesa a protestar, “Mas um, – de acordo com a Lei…”
João sentou-se; e imediatamente Pedro se levantou a perguntar se não estavam a esquecer que já se tinham afastado da Lei aceitando Gentios, e que na verdade a igreja de Antioquia não era a primeira a fazê-lo.
“Lembrem-se do Etíope que Filipe baptizou,” disse ele, “e do Centurião Cornélio. Deus mostrou claramente que os Gentios devem ouvir a palavra e acreditar nela. Foi por causa da sua fé que Deus lhes deu o Espírito Santo, precisamente como Ele nos deu a nós. Por isso, porque razão deveria ser-lhes imposto o fardo extra da Lei? Não foi a Lei mas a Fé no Senhor que nos salvou – tanto a Judeus como a Gentios.”
Havia silêncio completo quando ele se sentou. E então verificando que Paulo e Barnabé estavam presentes, Tiago levantou-se a sugerir que eles lhes poderiam falar da sua experiência em cidades pagãs.
Barnabé foi o primeiro a falar. “Irmãos,” disse, “onde quer que fôssemos, pregávamos em primeiro lugar aos Judeus, mas de cidade em cidade afastavam-nos das suas sinagogas, enquanto que os pagãos nos pediam para lhes dizermos as notícias que trazíamos. Quem éramos nós para virarmos as costas a pessoas que andavam à procura de Deus?”
“E que é que pregavam a esses pagãos?” perguntou Tiago.
Paulo levantou-se para lhe responder. “O evangelho que pregávamos,” explicou ele, “era a fé em Cristo Jesus. Porque, como Pedro disse, não foi por guardar a Lei que nós, Judeus, recebemos o Espírito Santo. Foi pela fé no Cristo vivo. Antes da Sua vinda estávamos todos prisioneiros sob o poder da Lei, e ninguém mais do que eu. Mas agora eu estou morto para a Lei e vivo para Deus que é Deus tanto de Judeus como de Gentios. Eu pregava que todos os que têm fé em Cristo são filhos de Deus. Não há distinção entre Judeu e Grego, escravo ou homem livre, homem ou mulher. Todos somos um em Cristo.”
Tiago ficou impressionado com as palavras de Paulo, mas ainda perturbado. Perguntou se Paulo queria dizer que a Lei de Moisés não devia contar para nada desde que o homem tivesse fé.
“Não,” replicou Paulo, “mas a fé vem primeiro. Nós não destruímos a Lei. Pomo-la no seu lugar.”
Quando ele se sentou, Tiago, com a sua mente esclarecida, levantou-se para falar de novo à assembleia.
“Irmãos,” disse, “eu posso ver que temos que aceitar compromissos. Pelo que Pedro, Paulo e Barnabé disseram, parece claro que não devíamos pôr novas dificuldades no caminho destes Gentios que estão a voltar para Deus. Devemos antes fortalecê-los e dar-lhes coragem. Mas penso que devíamos enviar cartas a Antioquia e às outras igrejas onde há Gentios, lembrando-lhes os principais pontos da Lei que devem ser observados, dizendo-lhes que em Jerusalém não exigimos que os Gentios devam ser circuncidados.”
Todos concordaram, e de imediato começaram a preparar cuidadosamente uma carta que Paulo e Barnabé levariam consigo a Antioquia. Lá entregaram-na a Silas, que a leu alto para os Gentios Cristãos.
Silas leu:
Dos apóstolos e irmandade de Jerusalém aos irmãos que são Gentios em Antioquia da Síria – SAUDAÇÕES.
Os nossos amados Paulo e Barnabé, que arriscaram as suas vidas por amor de nosso Senhor Jesus Cristo, voltam a vós com esta mensagem.
Foi decidido não vos impor outro encargo além do que é absolutamente necessário dentro da Lei: evitar comida que tenha sido oferecida aos ídolos e de carne de animais que tenham sido estrangulados, e refrear a desonestidade.
Os nossos amados Paulo e Barnabé, que arriscaram as suas vidas por amor de nosso Senhor Jesus Cristo, voltam a vós com esta mensagem.
Foi decidido não vos impor outro encargo além do que é absolutamente necessário dentro da Lei: evitar comida que tenha sido oferecida aos ídolos e de carne de animais que tenham sido estrangulados, e refrear a desonestidade.
Fazei isto e prosperareis. ADEUS.
Paulo viu como os Gentios se aglomeravam à volta de Silas, aclamando com alegria e alívio esta decisão que permitia às pessoas tornarem-se Cristãs sem primeiro se tornarem Judeus. Depois voltou-se para Barnabé e disse que deviam levar esta notícia às igrejas da Ásia que tinham visitado.
Os olhos de Barnabé estavam postos em Marcos, que estava junto deles.
“Gostaria de o levar comigo,” disse tranquilamente; mas Paulo disse que não, porque Marcos os tinha abandonado uma vez, e não havia lugar para ninguém de coração mole no trabalho missionário. “Em Lystra,” notou, “o jovem Timóteo deseja juntar-se a nós. Ele será um melhor assistente.”
“Mas Marcos mudou,” insistia Barnabé, e chamou o seu sobrinho para vir ter com eles. “Agora que a irmandade de Jerusalém tomou esta decisão a respeito dos Gentios, Marcos tens vontade de trabalhar connosco. Não é assim, Marcos?”
“Sim, deixa-me ir convosco, Paulo,” suplicava Marcos. “Eu agora entendo.”
Mas Paulo estava firme. Disse que tinha pena, mas não estaria certo. Ele precisava de homens em quem pudesse confiar.
“Então,” disse Barnabé, “devemos ir por caminhos diferentes.” Porque ele tinha decidido que onde fosse, Marcos devia ir também. E assim, depois da sua longa amizade, Paulo e Barnabé separaram-se, e Paulo meteu-se a caminho da sua nova viagem, levando Silas de Antioquia como seu companheiro. Viajaram por mar e pelas montanhas de volta a Lystra, onde lhes foram dadas as boas vindas por Timóteo e sua mãe. Mesmo quando Eunice soube que Paulo queria que Timóteo se juntasse a ele no seu trabalho, consentiu de boa vontade. Acompanhou-os até às portas da cidade, e aí abraçou o seu filho a despedir-se.
Paulo, Silas e Timóteo viajaram muitas milhas juntos, levando as cartas para os Gentios Cristãos, até chegarem por fim ao porto de Troades nas praias do Oeste da Ásia. E aí Paulo caiu doente com malária. Timóteo tratou-o devotadamente, e quando Paulo se sentiu desanimado, a duvidar se teria sido insensato vindo para Troades, em vez de seguir a sua inclinação de ir para Éfeso, foi Timóteo a lembrar-lhe que foi o Espírito de Jesus que os levou a este lugar no termo do mar.
Mas Timóteo estava preocupado com as dúvidas e confusões de Paulo, pensando que eram causadas pela febre. Resolveu consultar Silas, e foi à procura dele. No pátio da hospedaria onde tinham a sua acomodação, o hospedeiro Carpo, estava ocupado a varrer; e sentado à sombra estava um estrangeiro, vestido em estilo Grego, com a sua capa e um grande chapéu de abas ao lado. Estava absorvido pelo que estava a fazer, – a escrever num rolo. Na sua ansiedade Timóteo mal o notou. O hospedeiro disse-lhe que Silas tinha saído cedo, e perguntou-lhe como estava Paulo.
“Está doente,” disse Timóteo, satisfeito por partilhar as suas preocupações com alguém. “Muito doente, penso. Parece estar a delirar.”
Carpo apontou para o estrangeiro Grego. “Bem, há um homem que o poderia ajudar. É um doutor da Macedónia, que fica aqui com frequência.”
Timóteo foi ter com ele. O doutor deixou de olhar para o seu trabalho.
“A paz esteja consigo,” disse Timóteo à pressa, e depois contou a sua história: o seu amigo estava doente. Poderia o doutor ir vê-lo?
O Grego levantou-se imediatamente.
“Leva-me a vê-lo,” disse.
Paulo estava agitado na cama, a resmungar.
Quando Timóteo e o doutor entraram, ouviram as palavras: “Onde?...Onde devia ir, Senhor? Mostra-me o caminho…Não me deixes falhar, Senhor…”
O doutor fez sinal a Timóteo para o deixar sozinho com Paulo, e depois sentou-se a seu lado e espremeu algumas ervas para um copo de água.
Paulo abriu os olhos e olhou para ele: “Quem é você?”
“O meu nome é Lucas, sou um médico.”
Lucas deu a beber o líquido das ervas a Paulo, depois examinou-o e banhou-lhe o peito. Assegurou que Paulo não estava tão doente como Timóteo tinha sugerido – não era mais que uma febre ligeira.
“Vieram de longe?” perguntou.
“De Antioquia na Síria, através da Cilícia e pela Ásia,” replicou Paulo.
“São pregadores Judeus, não são? Ouvi alguma coisa do vosso trabalho quando estava em Antioquia. Cristãos, penso que é assim que vos chamam?”
Quando Paulo lhe disse que era assim, perguntou como foi que vieram para Troades onde há bastante menos da sua raça que em Antioquia.
Este era o pensamento que tinha andado a perturbar Paulo, mas não ia dizê-lo a um estrangeiro. Em vez disso, disse com brevidade, “A mensagem que trazemos é para todos os homens.”
“Qual é a mensagem?” perguntou Lucas.
Paulo olhou para ele directamente. “Para os Gentios, para que se afastassem dos seus falsos deuses, para o único Deus verdadeiro, que é o autor de todas as coisas.”
“A religião Hebraica, de facto. Todos nós temos ouvido falar do vosso Deus todo-poderoso e invisível. E da vossa lei. Encontraram muitos que queiram deixar os deuses que conhecem para o Único tão distante e exigente?”
“Ele não está longe,” disse-lhe Paulo. “Ele está ao alcance de todos os homens.”
“E esse outro Único,” perguntou Lucas com ansiedade. “Aquele que chamam Cristo?”
“Ele é a expressão visível do único Deus invisível,” disse Paulo.
“Acreditas que Ele há-de vir brevemente a mudar o mundo?” Perguntou Lucas. “É isso que vós pregais?”
“Ele já veio, e está a mudar o mundo.”
“Onde está Ele?”
“Em todo o lado.”
Lucas duvidava se Paulo estaria mesmo a delirar, e pôs-lhe a mão na sobrancelha. Paulo agarrou-lhe a mão, e começou a falar com alguma da sua velha força e segurança.
“Ouve, Lucas,” disse com ansiedade. “Ele veio como homem para o povo da Galileia e da Judeia. Viveu entre eles e ensinou que os homens deviam amar-se uns aos outros, que deviam alimentar os famintos, curar os doentes, e adorar Deus com todo o coração; e prometeu que Deus havia de mandar o Seu Espírito sobre a humanidade e que este Espírito nunca os abandonaria…É este Espírito que hoje vive em nós – este Espírito que está a fazer que os pagãos abandonem os seus falsos deuses. Não vês, não é já uma questão de os Judeus dizerem aos Gentios que o seu Deus é o verdadeiro, mas o Espírito vivo de Cristo a ser derramado sobre todos os homens que acreditam nele.”
Lucas estava impressionado com a sinceridade e impaciência do tom de Paulo.
“Um Deus universal,” disse interrogando-se. “Um Espírito universal. Sim, podia acreditar nisso,” continuou, com interesse a crescer na sua voz. “Um Deus de Amor que cuidasse dos famintos e dos doentes, dos escravos em cativeiro, do povo que vive em temor. No meu país são como ovelhas sem pastor, com tantos deuses a servir. Até o Imperador se igualou a um deus e exige adoração e sacrifício.”
Subitamente voltando-se para Paulo, falou com persuasão. “Paulo atravessa para a Macedónia e vem ajudar-nos.”
Mas Paulo parecia ter adormecido. Lucas apalpou-lhe a testa, cobriu-o e saiu deixando Paulo com os seus sonhos. Paulo tinha ouvido tudo o que Lucas tinha dito. E no seu meio sono febril viu com olhar da mente os deuses Gregos: Zeus, Hermes e Apolo; e os deuses Romanos: Liber e Silvano. Viu também o Imperador Augusto, com toda a sua pompa e poder. Depois viu o mar, e para além dele na praia, Lucas a acenar-lhe e a chamar, “Atravessa para a Macedónia e vem ajudar-nos.” Com a voz de Lucas nos ouvidos adormeceu profundamente.
Quando acordou no dia seguinte tinha de novo o seu antigo vigor e enérgica personalidade. Levantou-se e, tendo-se vestido, foi ao pátio à procura de Timóteo, que estava a ver a escrita de Lucas. Estava a escrever, disse ele, o que Paulo lhe tinha dito acerca de Cristo na noite anterior.
“Timóteo, meu filho,” disse Paulo, “desce ao porto e procura saber quando há um barco que vá viajar para a Macedónia.”
“Está melhor, mestre?” perguntou Timóteo.
“Muito melhor,” respondeu Paulo. “Porque agora sei para onde vamos.”
Quando Timóteo corria para o porto, Paulo voltou-se para Lucas e tomou-lhe as mãos.
“Lucas,” disse ele, “vou para a Macedónia para ajudar o teu povo.”
Os olhos de Barnabé estavam postos em Marcos, que estava junto deles.
“Gostaria de o levar comigo,” disse tranquilamente; mas Paulo disse que não, porque Marcos os tinha abandonado uma vez, e não havia lugar para ninguém de coração mole no trabalho missionário. “Em Lystra,” notou, “o jovem Timóteo deseja juntar-se a nós. Ele será um melhor assistente.”
“Mas Marcos mudou,” insistia Barnabé, e chamou o seu sobrinho para vir ter com eles. “Agora que a irmandade de Jerusalém tomou esta decisão a respeito dos Gentios, Marcos tens vontade de trabalhar connosco. Não é assim, Marcos?”
“Sim, deixa-me ir convosco, Paulo,” suplicava Marcos. “Eu agora entendo.”
Mas Paulo estava firme. Disse que tinha pena, mas não estaria certo. Ele precisava de homens em quem pudesse confiar.
“Então,” disse Barnabé, “devemos ir por caminhos diferentes.” Porque ele tinha decidido que onde fosse, Marcos devia ir também. E assim, depois da sua longa amizade, Paulo e Barnabé separaram-se, e Paulo meteu-se a caminho da sua nova viagem, levando Silas de Antioquia como seu companheiro. Viajaram por mar e pelas montanhas de volta a Lystra, onde lhes foram dadas as boas vindas por Timóteo e sua mãe. Mesmo quando Eunice soube que Paulo queria que Timóteo se juntasse a ele no seu trabalho, consentiu de boa vontade. Acompanhou-os até às portas da cidade, e aí abraçou o seu filho a despedir-se.
Paulo, Silas e Timóteo viajaram muitas milhas juntos, levando as cartas para os Gentios Cristãos, até chegarem por fim ao porto de Troades nas praias do Oeste da Ásia. E aí Paulo caiu doente com malária. Timóteo tratou-o devotadamente, e quando Paulo se sentiu desanimado, a duvidar se teria sido insensato vindo para Troades, em vez de seguir a sua inclinação de ir para Éfeso, foi Timóteo a lembrar-lhe que foi o Espírito de Jesus que os levou a este lugar no termo do mar.
Mas Timóteo estava preocupado com as dúvidas e confusões de Paulo, pensando que eram causadas pela febre. Resolveu consultar Silas, e foi à procura dele. No pátio da hospedaria onde tinham a sua acomodação, o hospedeiro Carpo, estava ocupado a varrer; e sentado à sombra estava um estrangeiro, vestido em estilo Grego, com a sua capa e um grande chapéu de abas ao lado. Estava absorvido pelo que estava a fazer, – a escrever num rolo. Na sua ansiedade Timóteo mal o notou. O hospedeiro disse-lhe que Silas tinha saído cedo, e perguntou-lhe como estava Paulo.
“Está doente,” disse Timóteo, satisfeito por partilhar as suas preocupações com alguém. “Muito doente, penso. Parece estar a delirar.”
Carpo apontou para o estrangeiro Grego. “Bem, há um homem que o poderia ajudar. É um doutor da Macedónia, que fica aqui com frequência.”
Timóteo foi ter com ele. O doutor deixou de olhar para o seu trabalho.
“A paz esteja consigo,” disse Timóteo à pressa, e depois contou a sua história: o seu amigo estava doente. Poderia o doutor ir vê-lo?
O Grego levantou-se imediatamente.
“Leva-me a vê-lo,” disse.
Paulo estava agitado na cama, a resmungar.
Quando Timóteo e o doutor entraram, ouviram as palavras: “Onde?...Onde devia ir, Senhor? Mostra-me o caminho…Não me deixes falhar, Senhor…”
O doutor fez sinal a Timóteo para o deixar sozinho com Paulo, e depois sentou-se a seu lado e espremeu algumas ervas para um copo de água.
Paulo abriu os olhos e olhou para ele: “Quem é você?”
“O meu nome é Lucas, sou um médico.”
Lucas deu a beber o líquido das ervas a Paulo, depois examinou-o e banhou-lhe o peito. Assegurou que Paulo não estava tão doente como Timóteo tinha sugerido – não era mais que uma febre ligeira.
“Vieram de longe?” perguntou.
“De Antioquia na Síria, através da Cilícia e pela Ásia,” replicou Paulo.
“São pregadores Judeus, não são? Ouvi alguma coisa do vosso trabalho quando estava em Antioquia. Cristãos, penso que é assim que vos chamam?”
Quando Paulo lhe disse que era assim, perguntou como foi que vieram para Troades onde há bastante menos da sua raça que em Antioquia.
Este era o pensamento que tinha andado a perturbar Paulo, mas não ia dizê-lo a um estrangeiro. Em vez disso, disse com brevidade, “A mensagem que trazemos é para todos os homens.”
“Qual é a mensagem?” perguntou Lucas.
Paulo olhou para ele directamente. “Para os Gentios, para que se afastassem dos seus falsos deuses, para o único Deus verdadeiro, que é o autor de todas as coisas.”
“A religião Hebraica, de facto. Todos nós temos ouvido falar do vosso Deus todo-poderoso e invisível. E da vossa lei. Encontraram muitos que queiram deixar os deuses que conhecem para o Único tão distante e exigente?”
“Ele não está longe,” disse-lhe Paulo. “Ele está ao alcance de todos os homens.”
“E esse outro Único,” perguntou Lucas com ansiedade. “Aquele que chamam Cristo?”
“Ele é a expressão visível do único Deus invisível,” disse Paulo.
“Acreditas que Ele há-de vir brevemente a mudar o mundo?” Perguntou Lucas. “É isso que vós pregais?”
“Ele já veio, e está a mudar o mundo.”
“Onde está Ele?”
“Em todo o lado.”
Lucas duvidava se Paulo estaria mesmo a delirar, e pôs-lhe a mão na sobrancelha. Paulo agarrou-lhe a mão, e começou a falar com alguma da sua velha força e segurança.
“Ouve, Lucas,” disse com ansiedade. “Ele veio como homem para o povo da Galileia e da Judeia. Viveu entre eles e ensinou que os homens deviam amar-se uns aos outros, que deviam alimentar os famintos, curar os doentes, e adorar Deus com todo o coração; e prometeu que Deus havia de mandar o Seu Espírito sobre a humanidade e que este Espírito nunca os abandonaria…É este Espírito que hoje vive em nós – este Espírito que está a fazer que os pagãos abandonem os seus falsos deuses. Não vês, não é já uma questão de os Judeus dizerem aos Gentios que o seu Deus é o verdadeiro, mas o Espírito vivo de Cristo a ser derramado sobre todos os homens que acreditam nele.”
Lucas estava impressionado com a sinceridade e impaciência do tom de Paulo.
“Um Deus universal,” disse interrogando-se. “Um Espírito universal. Sim, podia acreditar nisso,” continuou, com interesse a crescer na sua voz. “Um Deus de Amor que cuidasse dos famintos e dos doentes, dos escravos em cativeiro, do povo que vive em temor. No meu país são como ovelhas sem pastor, com tantos deuses a servir. Até o Imperador se igualou a um deus e exige adoração e sacrifício.”
Subitamente voltando-se para Paulo, falou com persuasão. “Paulo atravessa para a Macedónia e vem ajudar-nos.”
Mas Paulo parecia ter adormecido. Lucas apalpou-lhe a testa, cobriu-o e saiu deixando Paulo com os seus sonhos. Paulo tinha ouvido tudo o que Lucas tinha dito. E no seu meio sono febril viu com olhar da mente os deuses Gregos: Zeus, Hermes e Apolo; e os deuses Romanos: Liber e Silvano. Viu também o Imperador Augusto, com toda a sua pompa e poder. Depois viu o mar, e para além dele na praia, Lucas a acenar-lhe e a chamar, “Atravessa para a Macedónia e vem ajudar-nos.” Com a voz de Lucas nos ouvidos adormeceu profundamente.
Quando acordou no dia seguinte tinha de novo o seu antigo vigor e enérgica personalidade. Levantou-se e, tendo-se vestido, foi ao pátio à procura de Timóteo, que estava a ver a escrita de Lucas. Estava a escrever, disse ele, o que Paulo lhe tinha dito acerca de Cristo na noite anterior.
“Timóteo, meu filho,” disse Paulo, “desce ao porto e procura saber quando há um barco que vá viajar para a Macedónia.”
“Está melhor, mestre?” perguntou Timóteo.
“Muito melhor,” respondeu Paulo. “Porque agora sei para onde vamos.”
Quando Timóteo corria para o porto, Paulo voltou-se para Lucas e tomou-lhe as mãos.
“Lucas,” disse ele, “vou para a Macedónia para ajudar o teu povo.”
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Timóteo e Paulo |
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